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O poder da direita nas redes: algoritmos e narrativas misóginas

Como as plataformas digitais amplificam discursos conservadores e enfraquecem a mídia progressista.

Gerada por IA

O conceito de Redpill surgiu no filme Matrix como um símbolo de “despertar” para uma realidade oculta. No entanto, nas últimas décadas, o termo foi apropriado por comunidades masculinistas online e se transformou em uma ideologia que denuncia uma suposta opressão contra homens, que seria promovida por feministas e progressistas.

Essa cultura emergiu em fóruns anônimos como 4chan, no final dos anos 2000, onde jovens majoritariamente brancos e de classe média começaram a compartilhar experiências de rejeição, interpretadas como uma forma de bullying sistemático.

Surge, então, um subproduto dessa cultura conhecido como “incel” (involuntary celibates, ou celibatários involuntários), que responsabiliza as mulheres pela sensação de isolamento e frustração sexual. Essa cultura de ressentimento é propagada em espaços onde discursos misóginos são glorificados como resposta às alegadas injustiças sofridas pelos homens.

A mulher se tornou alvo constante de hostilidade e de um discurso que culpa os feminismos por todas as dificuldades sociais e pessoais do homem.

Com o tempo, essas comunidades se expandiram para plataformas mais acessíveis. O Youtube, por exemplo, foi uma das primeiras a popularizar a monetização de vídeos em uma época em que não se discutiam políticas de moderação de conteúdo.

Nas redes sociais, o algoritmo também manda no jogo. É ele quem decide a prioridade e a distribuição do conteúdo. Isso acontece quando comparamos o Twitter e o atual X, de Elon Musk, o viés ideológico do algoritmo fica explícito.

As mídias independentes de direita tradicionalmente têm mais recursos, uma vez que são financiadas por grandes investidores privados e por grupos conservadores que patrocinam campanhas de marketing digital e publicidade. Já as mídias progressistas se sustentam com menos recursos, o que consequentemente limita seu alcance.

O Flow Podcast, um dos maiores do Brasil, surgiu em 2018 e exibiu até hoje mais de 800 episódios. Criado por Monark e Igor 3K, que já tinham canais voltados ao público gamer, o Flow adotou um tom de provocação até o episódio 545, quando Monark defendeu a criação de um partido nazista em contraponto a uma esquerda radical imaginária.

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“A Controvérsia”

A partir dali, Monark foi afastado. O programa adotou um tom menos extremista e abriu espaço para personalidades e políticos de vários espectros. Desta forma, conservaram alguma relevância ao contornarem o “cancelamento” com um rebranding.

Outras mídias, como Brasil Paralelo e Jornal da Cidade Online, disseminam visões conservadoras e críticas a esquerdistas, se posicionam contra movimentos sociais e exploram temas nacionalistas e de “valores tradicionais”.

A distorção dos conceitos de liberdade de expressão e democracia também é constante nesse tipo de veículo. Essa abordagem é acompanhada de discursos misóginos, diluídos ou disfarçados de opinião, o que conta com um conjunto de signos de comunicação para legitimar essas ideias distorcidas como uma verdade.

O apelo de fortes gatilhos emocionais engaja não apenas a bolha de direita, mas também são replicadas em mídias progressistas, seja por notas de repúdio ou noticiando o cometimento de crimes, ampliando ainda mais o alcance orgânico da desinformação.

No Brasil, veículos como Brasil 247, Diário do Centro do Mundo (DCM), Mídia Ninja, e Brasil de Fato defendem causas progressistas e cobrem temas relacionados à justiça e inclusão sociais, aos direitos humanos e ao meio ambiente. Essas mídias enfrentam dificuldade para alcançar o engajamento de suas contrapartes de direita por não terem bons resultados ao usarem os mesmos artifícios.

As estratégias para a cooptação de audiência das mídias de direita são baseadas em uma estética pretensamente nacionalista e numa linguagem agressiva, que incluem piadas machistas e repetição de falas sobre valores ditos tradicionais.

Redes como X, Facebook e YouTube são usadas por todas as mídias, mas as de direita conseguem amplificar temas polarizadores e explorar conteúdos polêmicos, sem moderação, nas plataformas como Telegram, Discord e Rumble.

A falsa discussão gira em torno de como mulheres deveriam se portar diante de “homens de bem” e inclui bordões contra “a opressão feminista”, “a ameaça à família” e “o interesse financeiro de mulheres em um relacionamento amoroso”. Esses argumentos desconsideram números oficiais de escolaridade, empregabilidade e violência de gênero que desmentem toda a falácia.

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Então por que a comunicação da direita chega tão longe?

O que diferencia a estratégia de cada lado para a proliferação de conteúdos engajadores são os gatilhos psicológicos. Veículos de direita exploram emoções intensas como medo, raiva e indignação, o que gera engajamento imediato e ajuda na viralização. Já a mídia progressista tende a ser mais analítica e menos apelativa, enfrentando dificuldade para captar esse tipo de reação emocional.

O pânico moral é um gatilho comum para abordar as pautas LGBTQIAN+. A ideia maniqueísta de que existiria uma guerra entre o bem e o mal “além do plano terrestre” e o senso de urgência do “é agora ou nunca” são estratégias de comunicação usadas pelas campanhas políticas e por mídias independentes conservadoras. 

O impacto dessas retóricas perpetua uma cultura profundamente antimulher.

Delma é jornalista, mestra em Estudos de Gênero e aqui escreve sobre cultura, feminismos e política brasileira. Trabalha há mais de 15 anos com conteúdo e marketing digital.
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